quinta-feira, 24 de outubro de 2013

19 - O LIVRO DAS MINHAS INQUIETAÇÕES * I

Primeira inquietação



Era uma vez um menino de uma povoação rural da Região do Alentejo, em Portugal. Embalou-lhe dolorosamente o berço o drama que enlutou o povo espanhol; horrorizou-lhe os passos incertos da meninice a tragédia de que foi protagonista maior o nazi-fascismo; envenenou-lhe a mocidade o horizonte que se queria sem esperança de um país amordaçado; lavou-lhe a alma, apenas, a múrmura corrente da Poesia.

Deslumbrado desde a juventude com as notícias das tertúlias de um tempo que não era o seu, de Antero a Pessoa, de Pessoa a Régio e Torga, etc, aquele menino, agora já encandeado pelos poentes da vida, sonhou reinventar uma tertúlia sem fronteiras. E assim nasceu CantOrfeu. O sonho de uma caminhada de amigas e amigos, falando de si e para si, das coisas da Arte, duma Arte viva, logo assumidamente diferente dos arraiais, onde a multidão se acotovela e se ensurdece, num descaminho vulgar e efémero; o sonho de gozar o silêncio, na meditação e na rememoração; o sonho no prazer de lembrar os «outros em quem poder não teve a morte».

Uma tertúlia prevenida contra o tumultuar da vida, onde o som pode ser música, mas também pode ser ruído, onde a palavra pode ser oração, mas também blasfémia, onde a voz pode ser canto, mas também gritaria, onde o ser e o não-ser se digladiam...

Ah, CantOrfeu, que sonho é o teu? E que realidade é a tua?


José-Augusto de Carvalho
Viana*Évora*Portugal
25 de Novembro de 2006.

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