segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

11 - O MEU RIMANCEIRO * A praga



(QUE VIVA O CORDEL!)






Um dia, p’la Primavera,

na festa de todos nós,

o povo soube quem era

e de novo teve voz.



Gritou a sua razão

há tanto tempo oprimida!

Não mais havia a prisão

p’ra quem reclamava a vida.



Declamaram-se os poemas

p’la tirania banidos…

E quebraram-se as algemas

dos caminhos proibidos…



Houve abraços e beijinhos

e também amor jurado

de quem, por outros caminhos,

andara a passo trocado.



Chegara a fraternidade

aos desavindos que houvera.

Chegara a claridade

vestida de Primavera.



Foi tudo assim tão bonito,

até à praga fatal:

isto assim é tão bonito

que só pode acabar mal…





José-Augusto de Carvalho
Alentejo, 27 de Fevereiro de 2017.




sábado, 25 de fevereiro de 2017

11 -- O MEU RIMANCEIRO * Evidência

(QUE VIVA O CORDEL!)






Por favor, não mintam mais! 

Com os anos aprendemos 

que são falsos os sinais 

que emitem e recebemos. 



No paul que nos atola, 

que valha a sabedoria: 

quando grande é a esmola, 

sempre o pobre desconfia. 



E se há muito isto aprendemos, 

nos falta agora aceitar 

que quando mal escolhemos 

não há de que reclamar. 



Quem sabe o que lhe convém, 

não poderá ignorar 

que não se pede a alguém 

o que não tem para dar. 





José-Augusto de Carvalho 
Alentejo, 25 de Fevereiro de 2017 


sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

36- VIVÊNCIAS DOS CAMINHOS * Luís Diogo

Novembro de 1998, numa povoação andaluza.
Identifico os Amigos Guilherme Camacho, à nossa esquerda, já falecido; 
Luís Diogo, de amarelo; e Augusto Chanoca, tb já falecido.
.
Aqui fica a memória de outros tempos e a minha saudade imperecível.




Memória da Revolução dos Cravos
Ao fundo da foto: da nossa esquerda para a nossa direita, 
Cunha, Ângelo e Crisanto.
à frente no foto: também da nossa esquerda para a nossa direita, 
?, dr. Pedrosa Ribeiro e Luís Diogo.
Penitencio-me por não recordar o nome do colega.
*
A imperecível amizade Luís Diogo enviou-me esta foto em 12 de Dezembro de 1998 e escreveu estas palavras que calaram fundo no meu coração: Faltaste tu. Para o próximo ano, tens de me dar a honra de estar aqui neste mesmo local.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

25 - LIVRO TEMPO DE SORTILÉGIO * A espera






Ensombra o teu sorriso um rictus de tristeza.



O teu olhar vagueia além do tempo-agora.


E sempre, num vaivém de espera e de incerteza,

ausente nos esconde a angústia da demora.



Teu corpo exausto e nu, doído de mazelas,

num vago estremecer de fera encurralada,

desmaia, num palor de antigas aguarelas,

anseios e clarões de antiga madrugada.



Das tuas hirtas mãos, suspenso ainda o alor

dum êxtase de luz que a noite enegreceu.

Amor, onde estará, sortílego, o pintor

que quis transfigurar-te e desapareceu?



Sem tinta nem pincéis, sem tela nem talento,

meu vivo coração te dou por alimento.





Alentejo, 18 de Dezembro de 2006

.José-Augusto de Carvalho


sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

22 - O MEU CANCIONEIRO - 2 * A gula






A contas com seu repasto,

sem pudor nem temperança,

vai o frei enchendo a pança,

que de carne não é casto.



Atento à gula do frade,

diz-lhe el-rei: tende cuidado,

comer tanto é arriscado,

tanto mais na sua idade!



Ah, Senhor, este prazer,

confessa o frei seu pecado,

é nada se comparado

á dor de outro já não ter…



Ah, que prazer sobrevinha!

Que fome me consumia!

E quanto mais eu comia,

Mais era a fome que eu tinha!...



Divertido, olhando o frade,

El-rei, sorrindo, lhe diz:

Que o sabor dessa perdiz

Seja o da vossa saudade!...





José-Augusto de Carvalho
Alentejo, 21 de Dezembro de 2006.
.
(III - Canções de escárnio e maldizer)

15 - CANTO REBELADO * Aqui!






Aqui, se rende ao mar a terra despojada.

Os sonhos de luar, bordados na fragrância

florida dos jardins da lenda perfumada,

sucumbem ao furor da ignara intolerância.



Do ledo murmurar das fontes, a memória

esvai-se devagar, num tempo de clausura.

Dos tempos de esplendor à mácula censória,

que triste condição ainda em nós perdura!



Que faço agora aqui com esta liberdade,

se em tudo o verbo ter supera o verbo ser?

Que sonho de evasão eu posso desta grade,

se a força do poder está no verbo ter?



Resisto e grito: não! E, ao sol deste dilema,

com sangue escrevo, letra a letra, este poema…







José-Augusto de Carvalho
Alentejo, 15 de Outubro de 2006.

domingo, 12 de fevereiro de 2017

11 - O MEU RIMANCEIRO * O decreto



(QUE VIVA O CORDEL!)







Desde o princípio, este drama.

E nadinha se alterou:

se quem não chora não mama,

quem não chora já mamou?



Vem do berço a velha manha,

mais ainda enraizada

porque mais raízes ganha

com tanta e tanta mamada.



Que importa haver quem reclame?

Há até quem acredite

que decretado o desmame

se acaba tanto apetite.



O problema é o decreto.

Que valente agora vem

dizer ao povo eu decreto

que não mama mais ninguém?



Seria o bom e o bonito

ver tanto bebé-chorão

reclamando num só grito

por mama ou por biberão.





José-Augusto de Carvalho
Alentejo, 12 de Fevereiro de 2017.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

03 - ESTA LIRA DE MIM!... * A súplica angustiada

A súplica angustiada





Nas dobras do silêncio assim envolto,


calada continua a tua voz.

Não ouves o rugir do mar revolto,

que noite e dia vem chamar por nós?



Não vês por sobre as vagas as gaivotas

buscando verga firme onde poisar?

Não vês que dos confins emergem rotas

gritando que é preciso o navegar?



Desperta! Assim, não vês nem ouves nada!

Em que álgida renúncia te amarfanhas

de punição e lágrimas de sal?



Do longe chega a súplica angustiada:

Quem nos perdeu das terras das Hespanhas,

dos áureos areais de Portugal?






José-Augusto de Carvalho
Alentejo, 6 de Fevereiro de 2017.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

13 - NA PALAVRA É QUE VOU... * O desaforo


Aos Autores antologiados não será solicitada nem oferecida nenhuma contrapartida para a participação na obra, não serão igualmente ofertados exemplares da mesma.




Todos sabemos que a escrita é anterior à actividade editorial.

Todos sabemos que a actividade editorial decorre da escrita ou, dito de outra maneira, sem autores não há editores.

Assente esta realidade que não oferece contestação, chega-me a surpresa absurda de uma editora convidar autores para colaboração numa amostragem de autores actuais, vulgo antologia, mas desde logo informando que esses mesmos autores não terão direito a receber um volume de oferta ou, mínimo dos mínimos, não terão direito direito a um volume a custo reduzido.

Ocorre, assim, esta situação: a editora recebe a colaboração, edita-a, comercializa-a e os autores recebem o prazer de ver os seus trabalhos editados. 

Edificante!

Que imperativos legais impedem os autores de se associarem e combaterem este desaforo?

Até sempre!

José-Augusto de Carvalho
Alentejo, 1 de Fevereiro de 2005.

13 - NA PALAVRA É QUE VOU... * Os feriados

Advertência: o texto abaixo é de Dezembro de 2014. Ficam os considerandos sobre os feriados.
*
A questão dos feriados não poderá ser analisada com a leviandade que se anuncia e que prefigura uma ameaça grosseira à memória colectiva de um povo.

--- O 5 de Outubro não assinala, apenas, a implantação da República(1910); assinala, também, tanto quanto sei, a independência, no recuado século XII (1143);


--- O 1º. de Dezembro (de 1640) assinala a recuperação da independência perdida e não constitui qualquer afronta a Espanha;


--- O 14 de Agosto (de 1385), que deveria ser feriado e não é, vá lá a gente entender o porquê de tamanha desconsideração, assinala a manutenção da nossa condição de país independente na Batalha de Aljubarrota;


--- O 10 de Junho assinala Camões e a pátria imortalizada n'Os Lusíadas;


--- O 25 de Abril (1974) assinala a recuperação da dignidade perdida.


Que querem matar, afinal?


Os nossos maiores coram de vergonha! É esta afronta que devemos ao seu denodo e à nossa identidade?


Indignado, aqui fica meu protesto.


José-Augusto de Carvalho

29 de Dezembro de 2014.
Viana * Évora * Portugal


*
Importante: Não se incluem no texto acima os feriados internacionalmente consagrados: o 1º. de Janeiro, o 1º. de Maio e o 25 de Dezembro, na certeza, se é que vivemos em tempo de certezas, de que não serão objecto de represália.
*
Nota: Desenho do Escultor José Dias Coelho, resistente anti-fascista assassinado pela PIDE, na década de sessenta do século XX.

13 - NA PALAVRA É QUE VOU... * Considerandos



Recupero de texto já publicado a excelente frase de um meu conterrâneo: «Só todos juntos sabemos tudo.»

Arrisco afirmar que esta frase tem um alcance invulgar e, por isso mesmo, deveria figurar em todos os manuais de conduta.

Várias vezes, em conversas com gente da minha gente, encontro sugestões que considero de grande valia conducentes a aprofundar situações e a estudar soluções.

Evidentemente que estas conversas dificilmente chegarão ao conhecimento de quem conduz os nossos destinos colectivos.

E se aqui não discuto a legitimidade de quem tem o poder de decidir, já discuto a perda destas sugestões, até porque relevarão em valia muitas das decisões que são tomadas.

Todos sabemos ser tarefa de qualquer poder político a gestão quanto baste das necessidades correntes; mas também todos sabemos que qualquer força política tem a sua ideologia e desta decorrem definidas propostas de melhoria de uma qualquer situação em análise, das muitas situações que existem e que vão muito para além das supracitadas necessidades genéricas e correntes.

Por tudo isto, será de colocar estas interrogações:

Como chegámos aqui?

Por que chegámos aqui?

Será que o Povo aceita passivamente quanto o Poder Político decide?

Que motivos levaram o Povo ao distanciamento, ao afastamento da res publica?

Que motivos levaram o Povo a assumir posições claras nos actos eleitorais, quer abstendo-se, quer votando em branco, quer votando nulo, em percentagens relevantes?

Será que as forças políticas estão esticando a corda até esta se partir?

Será que as forças políticas se recusam a ver que estão deficientemente servindo a democracia --- Democracia enquanto Poder do Povo?

Se, etimologicamente falando, Democracia é igual a Poder do Povo, fica claro que democracia sem povo é coisa nenhuma. E é isto que me preocupa enquanto cidadão.

Até sempre!


José-Augusto de Carvalho

Alentejo, 26 de Setembro de 2014.

13 - NA PALAVRA É QUE VOU... * Posição


A minha identificação incondicional com o Homem de todas as latitudes, independentemente do credo, da cor, da raça, não me cerceia o dever de dignificar a minha condição de cidadão português e a língua portuguesa.

Serei modesto em conhecimentos, eu sei. Nem estou aqui pretendendo competir nesse campo ou noutros e muito menos pretendendo ensinar seja o que seja.

Estou aqui, sim, para verberar todos aqueles que supõem ter o poder de impor, em Portugal, qualquer língua estrangeira como meio de comunicação nacional.

Dizia o Poeta Fernando Pessoa: «A minha pátria é a língua portuguesa.» E eu subscrevo, sem reservas, esta sua afirmação, não por ser dele, mas por a considerar certa.

E esta minha postura em nada colide com a aprendizagem de outras línguas, aliás bem necessárias nestes tempos de hoje. 
Atribuir-me tamanho desaforo é confundir as coisas. 

Evidentemente que há responsáveis por esta tentativa de menorização da língua portuguesa, a começar por alguns políticos, alguns comentadores e por aí adiante…

Muitos homens grados do passado, de Luís de Camões ao padre António Vieira, por exemplo, se revolverão no túmulo, indignados. 

E também, no presente, muitos homens de mérito corarão de vergonha. Sei não estar sozinho ao subscrever esta postura.


José-Augusto de Carvalho
4 de Agosto de 2011.
Viana*Évora*Portugal

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

13 - NA PALAVRA É QUE VOU... * Encruzilhada


Eu sei onde nasci, foi aqui, nestas planuras transtaganas, ao sol escaldante do meio-dia de um há muito passado dia do mês de Julho. 

Hoje, sozinho, não sei onde irei morrer. Talvez aqui onde nasci, talvez nalguma lonjura perdida em algum recanto deste mundo. 

O Padre António Vieira disse, e cito de cor, que os portugueses têm um pequeno país por berço e o mundo inteiro para morrerem. É uma grande verdade e não sei se eu irei demonstrar isso mesmo.

Pátria-cais de inquietação, quem irá saber onde cada um de nós irá rumar?

Pátria-desafio, quem irá saber o dia de amanhã?

Diz a sabedoria que a mais difícil procura é a interior, aquela angústia que nos leva à procura de nós mesmos.

Quiseram os fados que eu perdesse tudo quanto dava sentido à vida, à minha vida. 

Irão querer esses mesmos fados a minha renúncia? Por minha vontade, não.

Enquanto estamos vivos, há sempre um amanhã por haver. E porque assim é, eu quero ver esse amanhã. Traga o que trouxer, eu enfrentarei. 

A vida é um caminho, logo temos de caminhar enquanto tivermos um sopro de vida. Virá o dia que descansaremos na berma do caminho e adormeceremos a interminável noite que nos espera. Sem dramatismos. E resistiremos enquanto houver memória de nós naquelas e naqueles que nos amaram. Depois, será o absoluto silêncio.


José-Augusto de Carvalho
Alentejo, 2 de Fevereiro de 2017.

31 - NAS ÁGUAS DO NOSSO ODIANA * Encantamento




Antes de ti, as águas deste rio

cumpriam-se correndo sem parar.

Tinham por condição o desafio

de regressar aos caos --- o imenso mar. 



Cumpriam por cumprir o ciclo antigo,

vazias de emoção e sentimento,

como se a vida fosse, por castigo,

comer o pão sem sal e sem fermento.



Só quando tu chegaste a luz raiou.

E tudo em derredor ganhou sentido.

Até um passarinho desenhou

no céu azul as flor’s do teu vestido.



As águas, num murmúrio apaixonado,

beijavam as pedrinhas que rolavam 

num cálido bailar desordenado

em que, sem se ferir, se entrechocavam.



Os olhos do jumento que bebia

fixando a sua imagem com surpresa,

supunham encontrar a companhia

da sua condição e natureza.



Os patos que nadavam prazenteiros

mais pareciam ser de porcelana

no sonho de alma que a sondar roteiros

pintava de magia o nosso Odiana.



E eu era um marinheiro destemido

nas ondas dos teus olhos verde-mar,

a descobrir, indómito, o sentido

de me perder no porto por achar.




José-Augusto de Carvalho
Alentejo, 2 de Fevereiro de 2017.



13 - NA PALAVRA É QUE VOU... * A minha Pátria é a Língua Portuguesa


A minha pátria é a língua portuguesa. Esta celebrada frase de Fernando Pessoa será o melhor título para esta minha reflexão. Com ela, o Poeta rasga horizontes próximos e distantes. Desde este cais inquieto, no extremo ocidental europeu, até aos confins do mundo a haver. Ou, como disse Camões, E se mais mundo houvera lá chegara.

Não sei se Portugal é uma pátria de poetas, mas é, seguramente, uma pátria muito amada pelos seus poetas.

Chegámos a todos os povos e com eles nos misturámos. Para nós, não há raças nem credos erguendo barreiras, há gente, há a humanidade toda, rica na sua pluralidade, única na sua singularidade. Por isso nos misturámos, por isso nos misturamos.

É esta herança que temos, lavada de sal e de inquietação, vestida de assombros e de naufrágios, cantada pelos desafios de antemanhãs enfeitiçadas e chorada pelos crepúsculos da tal apagada e vil tristeza de que também nos fala Camões.

Estes Poetas e tantos outros filhos desta mesma pátria fizeram e fazem da língua portuguesa o seu altar e nele rezaram e rezam os seus poemas, poemas de amor e dor, de sonho e pesadelo.

No verbo destes Poetas não há a estreiteza nacionalista. Há, sim, a assunção duma identidade reconhecida desde há séculos. Uma identidade ferida aqui e ali por gente ou incauta ou desavisada. E para não sair desta minha terra natal, pois, saindo, mais encontraria, infelizmente, aqui fixo a vulgaridade de Abana Viana, a comunhão incompreensível de Viana Summer ou o inadequado Cinema dos Avós.

Talvez este e outros reparos publicados ou a publicar neste meu espaço sejam ignorados ou tidos por irrelevantes. Que sejam! Tal não me levará a abdicar do direito à opinião.


Até sempre!

José-Augusto de Carvalho
23 de Junho de 2012.
Alentejo*Portugal

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

13 - NA PALAVRA É QUE VOU... * Política


Todos sabemos que a palavra política significa o governo da cidade.

Dos gregos nos chegou.

E governar a cidade é zelar pelos interesses dos cidadãos. Assim sendo, não é de mais falarmos de política e atentarmos no que fazem e não fazem aqueles que elegemos para determinarem os caminhos mais adequados da nossa vida colectiva.

Eleger é votar e votar é escolher, logo todos nós assumimos a responsabilidade de confiar o Poder (o governo da cidade) a alguém; e esse alguém escolhido por nós assume a responsabilidade de honrar a escolha cumprindo os objectivos propostos.

Considerando que isto é tão claro, daqui partiremos para ver o que se passa,
para entender o porquê do que se passa e para decidir se o que se passa nos convém e é justo, porque...

... Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária.

(Artigo 1º. da Constituição da República Portuguesa)


Até sempre!

José-Augusto de Carvalho
7 de Julho de 2012.
Alentejo*Portugal

13 - NA PALAVRA É QUE VOU... * Do relativismo



Quando planeias por um ano, 
semeias o grão;

Quando planeias por dez anos, 
plantas árvores;

Quando planeias por uma vida inteira, 
formas e educas as pessoas.


Provérbio chinês.

13 - NA PALAVRA É QUE VOU... * Ventos




Quando os ventos de mudança sopram,

umas pessoas levantam barreiras,

outras constroem moinhos de vento.


Érico Veríssimo
Escritor brasileiro do Estado do Rio Grande do Sul

13 - NA PALAVRA É QUE VOU... * Eles


Eles!... Quem não se lembra de ser assim que o Povo se referia aos governantes do autoproclamado Estado Novo? A utilização deste artigo pessoal forma de sujeito revelava a sua recusa evidente a tratar pelos nomes os governantes de então.

Eram outros tempos, só vividos pelos mais velhos. Hoje, a maioria da população não era nascida ainda ou seria nova de mais para ter consciência daquela realidade.

A História daquele regime está feita, por isso não me irei deter na narração de episódios que vivi ou de que tive conhecimento em tempo real. Apenas me importa referir, agora, o regresso do eles. E tal regresso corresponderá ao desagrado que o Povo manifesta pelos governantes.

Hoje, Portugal vive em Democracia. O Povo tem liberdade de expressão e escolhe livremente os seus governantes desde a Junta de Freguesia à Presidência da República. É uma democracia limitada, todos nós o sabemos, porque há objectivos ainda não alcançados -- o direito pleno à Saúde, ao Trabalho, à Habitação, a uma vida digna e sustentada, à Justiça, à Segurança, etc.

Ora não é a democracia limitada que vivemos hoje que desagrada ao Povo, mas a perda da esperança de que a situação evolua de democracia limitada para democracia plena.

E esta perda de esperança é agravada por situações outras, as quais a Imprensa vai noticiando, reveladoras de que algo vai mal ou, quando menos, não vai bem. E estas notícias ferem gravemente a Democracia, quer quanto à imagem, quer quanto à credibilidade enquanto regime eleito pelo Povo e para o Povo.

Todos sabemos que o Povo anseia por transparência a todos os níveis e que reage negativamente quando entende que essa mesma transparência não se verifica. Poderá argumentar-se que nem sempre o Povo bem ajuíza. Poderei conceder que assim seja, mas, quando tal assim se entender, o recurso ao esclarecimento é o caminho a seguir. O Estado de Direito não é uma farsa nem uma abstracção, é uma realidade digna e concreta e um objectivo civilizacional de homens livres.

Convirá que os governantes recuperem a identidade, recusando a designação de eles e o anátema de eles são todos iguais. Mais, é urgente que os governantes se assumam na diversidade das suas propostas e assim garantam ao Povo as inequívocas opções nas escolhas que tem o direito e o dever de fazer em cada acto eleitoral.

Até sempre!

José-Augusto de Carvalho
10 de Julho de 2012.
Alentejo * Portrugal

13 - NA PALAVRA É QUE VOU... * Os arrependidos


É-me sempre penoso ouvir ou ler os arrependidos.

Tenho o desprazer de conhecer alguns. Quem não os conhece, afinal? Destilam ódio quando falam ou escrevem, ódio de si mesmos, pois falam de um passado que assumidamente viveram. Obstinadamente, denigrem as causas que abraçaram e de que se afastaram ou de que foram afastados.

Comprazem-se em relatar episódios ou situações, mas sempre em condições de não poderem ser contraditados. Falam dos outros, esquecendo que ao tempo eram parte integrante desses outros, obviamente com as mesmas responsabilidades. E a denúncia não os absolve, se é que carece de absolvição o que dizem e/ou escrevem, desde que conforme com a veracidade e o rigor.

Claro que a praga dos arrependidos é de sempre. Como é de sempre o apetite conveniente por ouvi-los ou lê-los.

Outrossim é claro que grassa por aí um jornalismo que divulga ou dá voz aos arrependidos sem buscar a elementar comprovação do que permite seja propalado. E assim é conivente no lodaçal da delação.

É que a questão não passa pela denúncia. Passa sempre, evidentemente, pela queixa formal a quem de direito. Para tanto, bastará, ao que suponho saber, uma carta à Provedoria Geral da República ou à Polícia Judiciária. São estas Entidades Oficiais da República que averiguam as iniquidades e depois as remetem a Juízo.

Vivemos, desde a vitoriosa Revolução dos Cravos, num Estado de Direito.

Até sempre!

José-Augusto de Carvalho
Lisboa, 10 de Agosto de 2012.

13 - NA PALAVRA É QUE VOU... * Para meditar


13 - NA PALAVRA É QUE VOU... * Burocracia


Burocracia, palavra que nos vem do francês e que poderemos traduzir por força ou poder dos gabinetes. Chegamos lá desta forma: bureau (secretária, escritório, repartição, ministério, junta, estabelecimento público, em francês) e krateía (força, em grego).

Desde há muito, não sei precisar, a palavra burocracia ganhou o significado depreciativo de sistema de rotinas e formalismos de secretaria. Ousemos, de forma livre, entender a burocracia como um modo de agir desligado das múltiplas perspectivas de apreciação que uma realidade dada exige ou poderá exigir.

Algumas vezes, a burocracia cai em situações que poderemos, numa caricatura, definir como um pé ter de se adaptar à forma dum sapato e não, como é óbvio, o sapato ter uma forma adequada para esse mesmo pé. Todos nós, alguma vez, certamente, vivemos ou tivemos notícia deste absurdo.

Evidentemente que a burocracia, no significado corrente que lhe vimos dando, decorre não só da adopção da rotina como sistema de actuação como também da impreparação que encontra defesa nessa mesma rotina.

Já nos recordava Camões, em oportuno soneto, no século XVI:

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.

Quanto antecede, remete-nos para a urgência de quem governa dever estar sempre em permanente sintonia com as aspirações das populações; e se não puder ou não souber agir assim, colherá o fracasso da sua acção e o repúdio dos que quis governar.

Finalizando: se o Poder emana do Povo, como pode o Poder exercer a sua acção ignorando o Povo ou governando contra o Povo?

Até sempre!

José-Augusto de Carvalho
15 de Agosto de 2012.
Alentejo * Portugal

13 - NA PALAVRA É QUE VOU... * Os meus textos

Os meus textos não têm destinatários preferenciais.

Tempos houve que sim, que almejava ser lido por esta ou aquela pessoa. Foi o tempo romântico, que já lá vai, há muito. Desses caminhos, juncados de flores de utopia adolescente, restam pétalas secas e ressequidas. E uma saudade imensa da inocência perdida.

Hoje, escrevo para mim, como se fosse um diário. É certo que, neste blogue, publico os meus textos. E não menos certo é que tenho leitores, quase sempre amigas e amigos. Amigas e amigos que me criticam e me incentivam a não ficar calado. Outros há que me falam deste ou daquele assunto. E quando lhes digo já ter escrito sobre e publicado no blogue, logo me dizem que não me leram por absoluta falta de tempo. A falta de tempo é uma praga. Claro que antes falta de tempo do que falta de ar. Se assim não fosse, lá ficaria eu mais pobre ainda. Claro que ouço e calo. Não tenho por que me melindrar. Só me lê quem quer. Verdade que alguns, raros, me foram ler, depois.

Como disse, ajo como se estivesse escrevendo um diário. E, quantas vezes, me leio e releio! Ora por desfastio, ora para recordar algumas situações. E como sempre sucede com quem escreve, dou comigo a corrigir mentalmente, aqui e ali, o texto já escrito e divulgado. E isto porque, como salientou o grande poeta espanhol António Machado, «o caminho faz-se caminhando» … Nada é definitivo e ainda bem.

Até sempre!

José-Augusto de Carvalho
18 de Junho de 2013.

 Alentejo * Portugal

13 - NA PALAVRA É QUE VOU... * Controvérsia?

Há muitas situações que resistem não pela sua bondade mas por nos termos habituado a elas, derivando desta habituação a sua permanência. Sabendo embora que provocarei controvérsia, haverá que agir com determinação e extirpá-las.

Na toponímia, encontramos algumas dessas situações. Há quem sustente que a substituição na toponímia corresponderá ao apagar da História. Discordo. A toponímia tem a finalidade de homenagear e só se homenageia quem merece. E com certeza que este merecimento poderá ser efémero ou prolongado no tempo, tudo dependendo sempre dos pressupostos que se vão considerando mais adequados. O objectivo da História é outro.

O Poder Político tem quase sempre a fraqueza de homenagear os seus correligionários, numa óbvia perspectiva de facção. Se é verdade, e a História atesta-o, que a vida socio-política é uma sucessão de facções no Poder, não é menos verdade que há figuras acima das facções. Há figuras de todos os tempos merecendo a nossa homenagem, ainda que, aqui e ali, possamos discordar do seu pensamento ou da sua acção.

Outras situações há de evidente inadequação, quer pela sua irrelevância relativa, quer por estranhas à nossa realidade concreta.

Além de figuras pacificamente aceites como nacionais ou internacionais, sustento que cada região (e até cada povoação, por que não?) terá o dever de homenagear a sua gente.

Porque assim entendo, é com mágoa que verifico a ausência de homenagem toponímica de figuras do Alentejo, de cada município e de cada uma das suas freguesias.

Algumas dessas figuras, falecidas há muito, terão caído no esquecimento. Mau caminho é o da perda da memória!

Quero crer que os boletins municipais deveriam encarregar alguém para tanto habilitado de avivar a memória do colectivo, trazendo da penumbra dos tempos as figuras que, pela sua acção, mereçam ser recordadas colectivamente. E, depois desse trabalho, ser ponderada a homenagem toponímica.

Neste como em todos os demais trabalhos que subscrevo, limito-me a usar de um elementar direito de cidadania – o direito de ter e de exprimir opinião.

Até sempre!

José-Augusto de Carvalho
18 de Agosto de 2012.
Alentejo * Portugal

13 - NA PALAVRA É QUE VOU... * Serviço Público



RADIOTELEVISÃO DE SERVIÇO PÚBLICO

Manual das melhores práticas



Independência editorial
Universalidade
Diferenciação
Diversidade
Informacão Imparcial
Educação/Instrução
Conhecimento
Coesão Social
Cidadania
Responsabilidade
Credibilidade



Editado por Indrajit Banerjee




Afinal, quem tem dúvidas sobre o que seja

o serviço público que a RTP deverá ter?

Não andará aqui rabo escondido com o gato de fora?

/

José-Augusto de Carvalho
29 de Agosto de 2012.
Alentejo * Portugal

13 - NA PALAVRA É QUE VOU... * A nostalgia do chefe


Vem de longe a nostalgia do chefe. Hoje, prefere-se usar a palavra inglesa leader ou a sua forma aportuguesada – líder. E é sempre olhada com desconfiança a alternativa da acção partilhada, na assunção, aliás sábia, que nos vem da parábola dos vimes.

Esta nostalgia será reveladora das reminiscências do mito da orfandade?

Ou decorrerá de séculos de menoridade?

Numa retrospectiva histórica, encontramos situações em que o Povo é usado para objectivos que lhe são estranhos; e outras em que, agindo embora como força motriz, cede a orientação a quem não se rege por propósitos iguais ou afins. E tal sempre ocorreu porque foi ludibriado ou porque assume uma incapacidade de se impor, incapacidade que não terá no todo ou em parte. Ora ceder a orientação é aceitar a chefia ou a liderança de outrem.

Historicamente, o Povo foi sempre a parte insignificante da dita civilização. As classes dominantes mimoseavam-no com epítetos degradantes: ralé, arraia miúda, gente baixa, e por aí…

A cidadania ou, melhor, o que se entendia por cidadania, era privilégio recusado ao Povo.

O grande poeta alemão Bertolt Brecht (1898-1956) fixou de forma exemplar o que eu canhestramente tento dizer. Aqui fica, com a devida vénia:



Perguntas de um Operário Letrado

Quem construiu Tebas, a das sete portas?
Nos livros vem o nome dos reis,
Mas foram os reis que transportaram as pedras?
Babilónia, tantas vezes destruída,
Quem outras tantas a reconstruiu? Em que casas
Da Lima Dourada moravam seus obreiros?
No dia em que ficou pronta a Muralha da China, para onde
Foram os seus pedreiros? A grande Roma
Está cheia de arcos de triunfo. Quem os ergueu? Sobre quem
Triunfaram os Césares? A tão cantada Bizâncio
Só tinha palácios
Para os seus habitantes? Até a legendária Atlântida,
Na noite em que o mar a engoliu,
Viu afogados gritar por seus escravos.
O jovem Alexandre conquistou as Índias.
Sozinho?
César venceu os gauleses.
Nem sequer tinha um cozinheiro ao seu serviço?
Quando a sua armada se afundou, Filipe de Espanha
Chorou. E ninguém mais?
Frederico II ganhou a guerra dos sete anos.
Quem mais a ganhou?
Em cada página uma vitória.
Quem cozinhava os festins?
Em cada década um grande homem.
Quem pagava as despesas?
Tantas histórias!
Quantas perguntas!


(Tradução do Professor Doutor Paulo Quintela)


É urgente, é inadiável assumirmos os nossos direitos e os nossos deveres.

Hoje e sempre!



José-Augusto de Carvalho
Lisboa, 6 de Setembro de 2012.

13 - NA PALAVRA É QUE VOU... * Reflexão


Vai distante o tempo em que tínhamos dificuldade na divulgação do nosso pensamento. Poucos tinham acesso a uma coluna de jornal. Hoje, a internet permite-nos ultrapassar facilmente essa dificuldade do passado. Só não tem um blogue quem assim decidir. Evidentemente que um blogue coloca-nos o mesmo problema antigo de uma folha de papel em branco: que escrever e para quem escrever?

Efectivamente, escrever é comunicar. E só há comunicação quando se é lido. Outra vantagem do blogue é a interacção: os comentários dos leitores são a prova provada de que se foi lido. E, aí, o autor do texto estará em condições de avaliar qualitativamente a interacção conseguida.

Outra vantagem acessória do blogue é o contador de visualizações. É importante, pois há muitos leitores que não comentam o que lêem.

Claro que há comentários e comentários, daí o blogue permitir a aprovação dos comentários recebidos. Há quem conteste o direito de aprovação de comentários. Inclusivamente, há quem considere este direito um acto de censura. Não subscrevo esta opinião, designadamente depois de ter lido insultos e desaforos que só colocam mal quem os subscreve. Pior ainda quando são anónimos. O anonimato é uma praga que invadiu os blogues onde se dispensa o direito de aprovação dos comentários.

Quem escreve tem o direito de expressar o seu pensamento; quem lê tem o direito de apreciar o que leu e de manifestar concordância ou discordância, mas sempre com a civilidade consentânea com o princípio que dispõe ser o respeito que devemos a nós mesmos o que determina o respeito pelos outros.

Hoje, a internet permite o diálogo entre pessoas fisicamente muito distantes entre si. Aliás, esta possibilidade já havia chegado com o telefone, no século XIX, mas jamais com a abrangência que a internet possibilita. Esta possibilidade, que tenho aproveitado e muito preciosa tem sido, quero crer que seja um dos caminhos a percorrer na intenção de cotejarmos princípios e valores. A Humanidade é só uma, o planeta é só um. Se bem nos entendermos, a caminhada será mais fácil e a Vida agradecerá.

Até sempre!
José-Augusto de Carvalho
11 de Setembro de 2012.
Alentejo * Portugal

13 - NA PALAVRA É QUE VOU... * Considerações cívicas


Na minha modesta intervenção cívica, sempre me inseri na força do colectivo, bem ciente da verdade que encerra a parábola dos vimes.

Acredito na decisão que decorre do confronto das perspectivas várias que se nos deparam quando analisamos um problema e buscamos solucioná-lo racionalmente.

Muitas vezes, foi vencida a perspectiva que apresentei; algumas vezes, saiu vencedora. Nada de importante, porque estava em causa encontrar uma solução e não a alimentação estreita de um qualquer ego igualmente estreito.

Ultrapassei barreiras, algumas com a satisfação do dever cumprido; outras com a recusa de enveredar por caminhos que não são nem nunca foram os meus.

Hoje, remetido ao meu cantinho doméstico, vejo com apreensão o presente e o futuro, tal como vi apreensivamente o passado mais ou menos recente. Muito se poderia ter feito e não se fez; muito há a fazer e não consigo vislumbrar condições para cooperar.

Hoje, campeia a presunção de vencer eleições. Para quê? A resposta das populações é visível no seu desencanto e no seu afastamento da res publica.
 
Bastará atentar no partido das abstenções e no partido dos votos em branco e dos votos nulos, ambos em crescimento preocupante.

Onde estão as propostas construtivas e credíveis para erguer colectivamente uma estrutura social sustentada e sustentável e com as garantias possíveis de progressão quantitativa e qualitativa?

Onde está a recusa de rendas e prebendas ao arrepio duma situação deplorável de baixos rendimentos, de carências sociais degradantes?

Onde estão as acções supletivas, privilegiando o fundamental e preterindo o acessório?

Até sempre!


José-Augusto de Carvalho
12 de Novembro de 2012.
Alentejo * Portugal