ESTA LIRA DE MIM!...
sábado, 17 de outubro de 2020
03 - LIVRO ESTA LIRA DE MIM!... * A roleta
A roleta
Sempre a culpa foi minha. Aceitei
os caminhos que a Vida rasgou.
Neles fui --- despojado me dei.
Hoje sou o que, exausto, restou.
Os caminhos de mim e os alheios.
Desencontros das horas malsãs:
perdição dos espúrios enleios;
cerração sufocando manhãs.
Sobrevindas ruinas do sismo
na tortura de incêndios e fumo,
desespero e mergulhos no abismo,
penitência e remorso por rumo.
Pano verde, sinistro, na mesa.
Sem defesa possivel, o jogo.
A roleta girou --- sem surpresa,
foi a banca a ganhar --- viva o logro!
03 - LIVRO ESTA LIRA DE MIM!... * No enleio da miragem
Foi sempre o doce encantamento que sonhei,
enleio de miragem viva a palpitar.
E quando, num assombro, tímido me dei,
mais nada, além de mim, eu tinha para dar.
Dos longes interditos, vinha a melopeia
dos mágicos arroios, pela primavera,
ao sol do mês de Abril, que, enternecido, anseia
p´lo pão da nossa bem-aventurada espera.
Descia, devagar, uma alba rara e mansa.
Na mesa, o leite e o mel que fora prometido.
No ramo, baloiçava, em sublimada dança,
o fruto mal maduro, em graça permitido.
Ousei querer além de mim o que sonhei,
como se eu fora o outro ou o outro fora eu...
Não soube ler Camões --- errei, sofri, paguei.
O sonho que sonhei foi sempre apenas meu.
José-Augusto de Carvalho
Lisboa, Outubro de 2020
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