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quarta-feira, 17 de agosto de 2022

10 - CANTO REVELADO * Dos aedos



Canto Revelado
*
Dos aedos




Os aedos cantaram as novas,

palmilhando caminhos plurais.

Eram novas vestidas de trovas,

de rimances e de madrigais.



Nos lugares do reino, perdidos

entre vales e extensas planuras,

luminárias e círios ardidos

nos vestígios do tempo às escuras.



Eram simples os versos rimados,

no rigor das formais redondilhas,

sublimando, nos antepassados,

o Princípio a florir maravilhas.



Nos azuis sem portais do interdito,

os cativos do chão que pisamos,

mais além, a verdade no mito,

revelada no Céu que voamos.



José-Augusto de Carvalho

Alentejo, 14 de Agosto de 2022.

terça-feira, 11 de dezembro de 2018

03 - LIVRO ESTA LIRA DE MIM * À bolina...



CANTO REVELADO 
À BOLINA… 





No meu alforge trago a referência: 

a sede no cantil mitigada, 

a fome no taleigo saciada, 

a paz duma frugal sobrevivência.. 



No peito trago o coração pulsante 

de velas navegando contra o vento 

clamando em qualquer tempo é o momento 

de ser e de rumar para diante. 



Que fique para trás o tempo morto 

que apenas é presente na lembrança 

e nas saudades raras de criança 

consegue dar-me instantes de conforto. 



O tempo é este tempo que me imponho: 

o tempo meu --- doutro nenhum disponho… 





José-Augusto de Carvalho 
11 de Dezembro de 2018. 
Alentejo * Portugal

quarta-feira, 29 de novembro de 2017

10 - CANTO REVELADO * A perpétua construção


(CANTO REVELADO)

A perpétua construção 


Dórdio Gomes, Pintor alentejano, com a devida vénia




Nem pratos de ilusões ou de lentilhas…

Nem taças do elixir dos desvarios…

Só quero do pão asmo das partilhas,

em sopas, no gaspacho, p’los estios.



O vinho e o pão devidos ao sustento,

para que o meu labor de cada dia

não sofra reduções de rendimento

nem mal augure os tempos de invernia.



O vinho e o pão do ajuste equitativo

que me garante a força do meu braço

e a minha condição que assumo e vivo

no que recuso e no que inteiro faço.



Que eu saiba ser plural na dimensão

multímoda e em perpétua construção.





José-Augusto de Carvalho

Alentejo, 29 de Novembro de 2017.

domingo, 21 de maio de 2017

10 - CANTO REVELADO * O Manifesto do Homem






Eu nunca quis a paz do medo e das afrontas.

Nem caridade eu quero ou quis por alimento.

Eu quero e sempre quis que me prestasses contas

pelas manhãs por ti vestidas de cinzento.



Não quis nem quero ser a fome que aborrece

a mesa do teu lar --- arfante de iguarias…

Não quis nem quero ser a renúncia que tece,

prostrada, a contrição das noites e dos dias.



É tempo de ir além do medo do teu leito, 

mofando-te num caos de insónias e pavores

em gargalhadas de fatal assombração…



É tempo, neste chão, de facto e de direito,

tu seres como eu sou, eu ser como tu fores,

do berço do principio ao termo do caixão.





José-Augusto de Carvalho
Alentejo,

quarta-feira, 13 de julho de 2016

10 - CANTO REVELADO * A biografia possível

Viana do Alentejo, 1944 * Eu, com 7 anos de idade.






Eu não sei. Por que vim? Donde vim?

Ah, mas sei o que quero de mim!



Trago dentro de mim a verdade

da semente lançada no chão:

trigo loiro sofrendo a ansiedade

da farinha amassada --- do pão!



Sobre a terra que sou e onde vivo,

Mal ou Bem só por mim sobrevive.

Nada pode manter-me cativo:

a verdade da terra é ser livre!



Os meus braços embalam no vento 

estes sonhos que a terra esboroa…

e na força que sou e alimento,

sou o sonho que é terra e que voa!





José-Augusto de Carvalho
Julho de 2002
Alentejo * Portugal

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

10 - CANTO REVELADO * Da vida e da morte





O pouco que me coube nas partilhas,
um quase nada, foi o desafio
de descobrir-me em nem sei quantas trillhas.

Em todas vi o verde da esperança
nos braços ternos do estival rocio
que sempre p’la tardinha ensaia a dança.

Em todas vi o medo do negrume
das horas invernais de desvario
descarregar borrascas e azedume.

Em todas vi caducas as folhagens
deixarem o arvoredo à chuva e ao frio
buscando o chão das trágicas romagens.

Em todas vi, viçosos, os perfis,
em remoçados hinos de elogio,
de enleios e paixões primaveris.

Mas em nenhuma vi a negação
de Abel morrendo às mãos do seu irmão.



José-Augusto de Carvalho
Alentejo, 20 de Janeiro de 2016.

quinta-feira, 5 de março de 2015

10 - CANTO REVELADO * Inquietação







Pequena é sempre a pátria que nos gera.

A nossa condição não tem fronteiras.

Se ser é recusar, quem degenera

e fica no não-ser das carpideiras?



De Norte a Sul, do Leste ao Ocidente,

o Mundo é um, de facto e de direito.

Em nós, a vida que palpita e sente

é água no caudal do mesmo leito.



Do mesmo tecto azul que nos abriga

ao mesmo chão que tudo nos garante,

nós temos por comum o quanto houver.



Se todos temos tudo por bastante,

que vento de discórdia alguns instiga

e o que é de todos só de uns poucos quer?







José-Augusto de Carvalho
6 de Junho de 2005.
Viana * Évora * Portugal

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

10 - CANTO REVELADO * Nostalgia de Abril






Mais um Inverno frio nos deixava…

Mais uma Primavera prometia…

E sempre uma esperança pontilhava

de estrelas este céu que se fechava

ao rútilo esplendor dum claro dia!



E sempre esta esperança que morria

em cada frustração que nos matava!

E sempre o desespero arremetia

na força renovada que nos dava

a Fénix que das cinzas renascia!



Ai, tanto se morria e renascia!

E sempre esta esperança acalentava.

Que fértil terra de húmus e porfia

a força dava à força que faltava

nas horas em que a vida mais doía?



De sangue e desespero se amassava

o pão que noite adentro se comia!

De sol a sol, o corpo tudo dava

a troco duma jorna que minguava

enquanto o desespero mais crescia.



Ah, mas, na sombra, a noite murmurava

enleios, numa terna melodia!

E antes de adormecer, já madrugava

nos versos da canção que prometia

livre e fraterna a terra que chegava!



Chegava a Liberdade que cantava

lusíada, em feliz polifonia,

o fim do pesadelo que matava

no dia todo em luz que despertava

a vida que chorava de alegria!



O pátrio povo em armas devolvia

o berço que das trevas libertava

ao povo que sem armas acudia.

E um povo todo irmão se estremecia

no imenso e terno abraço que se dava.



Navegar é preciso, prometia,

agora que o viver se precisava!

Nos braços embalada, a pátria ouvia!

E quanto mais ouvia mais se dava

ao sonho que se ousava e florescia.





José-Augusto de Carvalho
27 de Outubro de 2014.
Viana*Évora*Portugal

sábado, 2 de agosto de 2014

10 - CANTO REVELADO * Caminheiro


I

Sem antes nem depois, aqui estou.

Os ontens são um tempo já cumprido.

Os amanhãs, o tempo prometido

que ainda não chegou.



É hoje o tempo meu, o meu momento,

que para o bem e para o mal enfrento.



Não se recusa o tempo nem se adia.

No meu momento, sou

o tempo que chegou

e aqui me desafia.



É hoje o tempo meu, o meu momento,

que para o bem e para o mal enfrento.



Passivo ou actuante,

aqui me (in)determino.

Aqui, serei ou não de mim bastante.

No meu momento sou e me defino.



É hoje o tempo meu, o meu momento,

que para o bem e para o mal enfrento.



A pé e sem bagagem,

assumo esta viagem,

enquanto o tempo der…

Um dia, o torvelinho da voragem,

sequer no pó que houver,

o rasto fixará desta passagem.



II

No palco, nova cena, um outro personagem

virá representar,

talvez trazendo o sonho na bagagem

da sua caminhada eternizar…





José-Augusto de Carvalho
31 de Julho de 2014.
Viana*Évora*Portugal



quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

10 -CANTO REVELADO * Sangue antigo, sangue meu!





Sangue deste sangue sou.

Sangue herdado, sangue antigo.

Sangue que se derramou

e a terra-mãe empapou

em sacrifício e castigo.



Sangue antigo, sangue herdado,

farol que nunca se apaga.

Rio na terra cavado,

no impulso desesperado

que se dá e tudo alaga.



Sangue das minhas entranhas,

pulsando nas correntezas

de perigos e artimanhas,

entre mitos e gadanhas

de antemanhãs de incertezas.



Sangue antigo, sangue meu,

sangue que jorra da fonte

que já banhou Prometeu

e garante que sou eu

quem rasga o meu horizonte.



José-Augusto de Carvalho
8 de Janeiro de 2014.


Viana * Évora * Portugal

sábado, 26 de outubro de 2013

10 - CANTO REVELADO * Revelação



A dúvida foi sempre o meu escudo.

A dúvida de ser e perceber.

Com nuvens prenhes de água não me iludo,

por não poder chegar-lhes e beber.



E quando a chuva cai a prometer

o fim da tentação, eu testo tudo,

na dúvida constante de saber

se comprovado está ou se me iludo.



Minh’alma sempre à dúvida se deve,

numa ânsia angustiada de manhã!

Os sonhos de infinito em que se atreve

quer livres da serpente e da maçã!



No Céu há tanta estrela a lucilar

sorrindo da inconstância do luar!




José-Augusto de Carvalho
12 de Julho de 2002.
Viana*Évora*Portugal

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

10 - CANTO REVELADO * Rimance de um Povo singular



Era um povo singular

nesta faixa acantonado,

erecta e rectangular,

desenhada à beira-mar

com notas de ausência e Fado.



Um dia, mais atrevido,

ousou ir molhar os pés.

Depois, apurou o ouvido

para entender o sentido

do vai e vem das marés.



A dolente melodia

era um canto de embalar

que de longe prometia

um barco de fantasia

e sonhos de céu e mar.



E este povo singular,

indeciso, ponderava

a renúncia de ficar

na segurança do lar

que a terra firme lhe dava



ou aceitar a aventura

do desafio do mar

e ganhar-se na tontura

das lonjuras da loucura

onde ousar já é chegar…



Largou enxadas e arados,

largou trigais e moinhos,

e por mares encapelados

e ventos desesperados,

na distância, abriu caminhos…



Dobrou os Cabos da Dor,

da Desgraça e da Tormenta.

Ganhou promessas de amor

doutra cor e com sabor

a noz moscada e pimenta.



Deu à Pátria a dimensão

das partes todas do Mundo.

Foi por sonho e condição

caravela de evasão

que jamais irá ao fundo.



Quando os ventos da mudança

sopraram do pátrio chão

numa danada aliança,

ficou presa a esperança

neste cais em negação…



Que pesadelo te amarra

a urgência de navegar?

Que plangência de guitarra

em renúncia encerra a barra

a um povo filho do mar?




José-Augusto de Carvalho
25 de Outubro de 2013.
Viana*Évora*Portugal

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

10 - CANTO REVELADO * O sentido de ser

Foto Internet, com a devida vénia



A vertigem da tontura
é onde a vida se evade
e, numa instante procura,
à terra lança a loucura
das sementes da verdade.

A verdade minha e tua,
verdade de toda a gente,
que na fantasia estua
a sua crueza nua
até quando está ausente.

E nesta nossa aventura
rumo ao sentido de ser,
só uma instante procura
decifra a densa estrutura
do ser a acontecer.


José-Augusto de Carvalho
3 de Janeiro de 2008.
Viana*Évora*Portugal

sábado, 21 de setembro de 2013

10 - Canto revelado * Camarada

Tela de Dórdio Gomes, Pintor alentejano
Foto Internet, com a devida vénia.


Cada espiga suava o cansaço
ou, talvez, uma lágrima ardente.
Na fatia de pão ainda quente,
eu comia o calor dum abraço.

A pujança vital do teu braço,
p'la descrença algemado ardilmente.
Foste o ferro, ao sol incandescente,
à espera da têmpera do aço...

Não sabia, menino, que esta ânsia,
que eu colhia no vento, provinha
das papoilas vermelhas e bravas...

Não sabia, nos anos da infância,
que tu eras a fome que eu tinha,
saciada no pão que me davas...


José-Augusto de Carvalho

In arestas vivas, 1980.

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

10 - Canto revelado * Memória

Foto Internet, com a devida vénia.


A memória do tempo, caminhos
destes campos de ausência, maninhos…

A certeza de nós e a constância
das correntes da nossa irrisão…
E estes astros brotando do chão
e perdendo-se além, na distância!

Minha fome sagrada de pão, 
que, nos tempos perdidos da infância,
eu matei sem saber que esse pão
era a fome a doer na abundância!

E uma culpa, em intérmina instância,
que no banco dos réus, sem perdão, 
me agrilhoa à memória da infância
e amargura o sabor deste pão


José-Augusto de Carvalho
Viana * Évora * Portugal

4/9/96 (Corrigido em 6/7/2013)

domingo, 8 de setembro de 2013

10 - Canto Revelado * Meus caminhos



Nada tenho a temer.
Eu sei ler nas estrelas
os caminhos do fim...
Que as torturas a haver
não me percam de mim
se tiver de sofrê-las...

Se perdido de vez,
num sem rumo à deriva,
que a resposta ao apelo
de ansiedade e porquês
seja a dor sempre viva
de morrer a perdê-lo...

 Sei ganhar e perder,
 nada tenho a temer...

José-Augusto de Carvalho
1 de fevereiro de 2005.
Viana * Évora * Portugal



 La mia Strada
José-Augusto de Carvalho
Versão em italiano de Eliude Santana

Non ho niente da temere
Io so leggere nelle stelle
Le strade della fine…
Che le torture che io possa avere
Non se perdano da me
Se le dovrò subirne…

Se del tutto me perdo
Senza destino alla deriva,
che la risposta all’appello
d’ansietà e dei ‘perché’
che sia il dolore sempre vivo
di morire in perderlo…

So vincere e perdere,
Non ho niente da temere…



Mis Caminos
José-Augusto de Carvalho
Versão em espanhol: Alberto Peyrano

Nada debo temer.
Sé ver en las estrellas
los caminos del fin...
Si torturas ha de haber
no me saquen de mí
por padecerlas

Si me pierdo alguna vez,
sin rumbo, a la deriva,
que la respuesta al apelo
de ansiedades y porqués
sea el dolor llama viva
por morir al perderlo...

Sé ganar y perder,
nada debo temer...

***

Aqui reitero a minha gratidão a Eliude Santana e Alberto Peyrano pelo carinho das traduções. Bem-hajam!

10 - Canto Revelado * Percurso


Foto Internet, com a devida vénia


Da colheita de Maio Maduro,

Quanto baste de alento e de alvura.

Mitigar minha sede procuro

Na cisterna de chuva-água pura.



Na farinha e na chuva que amasso,

Minha fome modela o sustento.

É da Terra e do Céu este abraço

Onde crio o que sou no que faço.



Tudo em mim é a soma do todo,

Que é de pó e que é de água – este lodo,

Num pedaço de céu que me acena…



E assim vou, perseguindo este rastro

Que lucila a saudade de um astro,

Nesta cósmica angústia terrena…



José-Augusto de Carvalho

Lisboa, 13 de Dezembro de 2010.

sábado, 7 de setembro de 2013

10 - Canto revelado * Insano desafio

Foto Internet, com a devida vénia


Ah, vida, vida, insano desafio,
que tanto nos perturba e determina!...
Ah, fio de água incerto na campina, 
espelho de abandonos e pousio!

Que tentações sofridas, que percalços
doendo a carne viva dos caminhos?
Tão acerados são estes espinhos!
E como sangram tantos pés descalços!...

Ah, tempo por erguer, bendito e belo!
Ah, vinho e pão de aurora e temperança 
no céu pairando em balsas imprecisas!

Que mais nos pedes tu por este anelo:
um templo de verdade onde as crianças
p'ra sempre sejam as sacerdotisas!


José-Augusto de Carvalho
Lisboa, 4 de Setembro de 1996.

Corrigido, em Viana, em 8/7/2013.